Eternamente Lobato - 26 autores em busca de um herói nacional
Página publicada em: 04/08/2025
Gabriel Kwak (organizador) - R$94,00 (304 págs.)
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O jornalista Gabriel Kwak reúne neste livro 26 textos de 26 autores que viveram à época de Monteiro Lobato e, alguns deles, se relacionaram com a personalidade dinâmica e complexa do Monteiro Lobato fazendeiro do Vale do Paraíba do Sul, empresário, nacionalista das grandes causas, polêmico, visionário e, acima de tudo, magnífico escritor, que, sem dúvida alguma, criou, no Brasil, o que se convencionou chamar de Literatura Infantil. Mas não só estes, como também analistas mais recentes da obra lobatiana, como as professoras da USP Nelly Novaes Coelho e Marisa Lajolo, que fazem desta antologia o livro provavelmente mais amplo e profundo sobre a vida e a obra do grande Monteiro Lobato. (Leia a seguir...)

Plenamente identificado com uma das rupturas mais importantes trazidas pelos movimentos renovadores deste século (a que, desafiando a Lógica tradicional rompe as fronteiras entre Real e Imaginário) Monteiro Lobato funde os dois mundos. Uma das consequências mais importantes dessa fusão é que o “maravilhoso”, o “mágico” (aquilo que ultrapassa os estreitos limites da realidade concreta) se mostra possível de ser vivido por qualquer pessoa. Mostra que não é preciso sermos heróis ou heroínas extraordinários, pois qualquer ser humano comum pode viver numa “dimensão maravilhosa” através de sua “imaginação criadora.
Se preconceitos existem nessa literatura (e são facilmente encontrados), se devem ao fato de Monteiro Lobato ter sido um fiel reflexo da Sociedade e dos Tempos que lhe foram dados a viver. E não por ter sido, ele próprio, um escritor preconceituoso. A nosso ver, a maioria das críticas feitas ao universo da literatura infantil brasileira, pelos analistas do “ideológico” que ali pode ser detectado, sofre dessa distorção: apresenta a literatura como preconceituosa, em lugar de mostrá-la como fiel transmissora de um sistema preconceituoso, cujos valores (ou desvalores) ainda vigentes precisam ser eliminados do nosso viver. (É claro que é essa a intenção dos “analistas do ideológico”, mas não é isso que se evidencia em seu discurso crítico. O que fica é o ataque à obra analisada.)
O acusado “racismo” lobatiano (principalmente encarnado em Tia Nastácia) é, a nosso ver, uma mera representação do racismo açucarado que, no dia a dia, define a atitude do brasileiro em relação à raça negra. O que esse racismo tem de negativo (“açucarado” ou não) obviamente resulta do racismo que o mundo “branco” disseminou por toda parte, durante seu avanço colonizador na conquista do mundo do Poder e do Progresso, que é o nosso.
Da mesma forma, o acentuado “aristocratismo” de Lobato provém dos generosos ideais liberais, que entregam às minorias esclarecidas a responsabilidade de promover o progresso social e resolver os grandes problemas da humanidade.
Nietzschiano convicto, Monteiro Lobato foi dos que viam, no indivíduo de exceção, o motor que movia o progresso do homem e do mundo. Daí, o individualismo radical de Emília, que só não é sentido como “feroz” porque a gaiatice e graça com que ela o exerce atenua seu despotismo e desrespeito humano.
Muitos e muitos poderiam ser os fatores controversos a serem analisados, no sentido de se perceber a importância da obra lobatiana como visceralmente representativa da época de transição que o nosso século vem vivendo. Confluir de águas do passado e do presente de seu tempo, a obra de Lobato (principalmente a escrita para a meninada) é das que exigem hoje uma leitura crítica, para além da que visa o mero entretenimento.
Em lugar, pois, de ser eliminada do elenco de leituras a serem sugeridas à criançada, ela deve ser dada como proposta de discussão, debate e reflexão. E, sem dúvida, esse corpo a corpo com o texto se transformará em emoção e no prazer do entretenimento... (Nelly Novaes Coelho - Professora Titular da USP
Crítica Literária)